SAMPA 1&2: olhares sobre a Paulicéia
Eu sempre admirei a obra do mítico fotógrafo Henri Cartier-Bresson, no entanto ele não está entre os meus fotógrafos de cabeceira como o iconoclasta Willian Klein, o sublime Marc Riboud, o genial Robert Frank ou o cáustico Shomei Tomatsu. Então qual seria a razão de iniciar esta coluna citando HCB? Para mim, algumas citações do fotógrafo francês me tocam mais do que as suas próprias fotografias, entre elas a afirmação de que seria mais difícil fotografar no espaço onde nascemos e vivemos do que em lugares “novos”, “distantes”:
“To interest people on far away places to shock them, to delight them is not too difficult. The most difficult thing is on your own country. You know too much it’s a… when its on your own block, its such a routine, its quite difficult to get out.”(1973)
Concordo plenamente com ele. Esta foi uma das razões pelas quais comecei a tentar superar a minha “dificuldade”em fotografar pelas ruas de São Paulo durante as minhas férias de verão japonesas. Na minha concepção cidades como Osaka (onde moro) e outros lugares da Ásia que já visitei, são palcos naturais de “estranhamentos”, “descobertas”, “(des)encontros”, mais excitantes e reveladores do que a cidade onde passei parte da minha vida, São Paulo. Quando comecei a fotografar por Sampa, a sensação de caminhar com a câmera e tentar captar o movimento dos lugares “comuns” ao meu regime escópico – Av. Paulista, Rua Augusta, Praça da Sé, Vale do Anhangabaú, Barra Funda etc. era, ao final de algumas horas, um misto de sentimento de fracasso, tédio e de que alguma coisa parecia estar “fora do lugar”. Foi só a partir da minha visita em 2015 que comecei realmente a desafiar o meu olhar sobre a metrópole paulistana – e após muitas leituras sobre fotógrafos brasileiros e estrangeiros que retrataram a cidade também – mas faltava ainda algo… Foi quando tive o prazer de conhecer dois grandes fotógrafos que acabaram por direcionar meu olhar de forma inconsciente: Yuri Bittar e o mestre Itaci Batista.
A partir de muito bate-papo e algumas saídas para fotografar pela cidade da garoa nasceu o projeto fotográfico SAMPA. Três fotógrafos com olhares, trajetórias e experiências (eu sou o novato) no universo da fotografia bem diferentes, mas com propostas que se tangenciam: tentar decifrar e apresentar a cidade de São Paulo de forma pessoal, sem um roteiro pré-concebido, muito mais intuitivamente do que propriamente baseado em uma fotografia de caráter sociodocumental ou artístico, ou seja, liberdade para construir uma narrativa paulistana a partir de três olhares e em três séries de imagens que podem ser interpretadas separadamente ou em conjunto.
Confesso que após dois anos fotografando pelas ruas da Paulicéia (sempre nos meses de agosto e setembro) focado no projeto, acabei por “redirecionar” o meu viewfinder do vício de fotografar pelas ruas japonesas, ambiente urbano totalmente diferente e onde iniciei minha trajetória fotográfica. Fazendo uma digressão: para mim a cidade São Paulo se parece bastante com algumas metrópoles asiáticas como Manila ou Bangkok (Kuala Lumpur?) pelo seu ritmo, ocupação dos espaços urbanos, diversidade étnica, os seus “não-lugares” (como shoppings e estações), (in)segurança, tráfego caótico e… sujeira. E bem diferente de outras metrópoles como Tóquio, Paris ou Berlim onde já tive a oportunidade de visitar e fotografar.
Com a ideia do projeto na cabeça e mesmo distante geograficamente dos outros dois companheiros, fui a labuta. Entre 2016/2017 produzimos o material a partir de três séries pessoais. “Teatro Urbano” série de minha autoria, “Vida entre linhas” série feita pelo Yuri e “Anônimos” série de autoria do mestre Itaci. Trabalhos autorais a partir de uma proposta coletiva, com elementos estéticos que dialogam a partir de visões diferentes sobre a (pós)urbanidade paulistana e que, a príncipio, tinha como objetivo produzir um bom material para ser exposto aqui no Japão e quem sabe “um dia…” pudesse vir a ser publicado. O fato foi que após dois anos (duas exposições em Osaka e um workshop) o trabalho se materializou em forma de catálogo (SAMPA 1 & 2) contendo uma introdução e as três séries apresentadas em 45 imagens. O texto introdutório, a edição e a organização do catálogo foram feitas por mim com o suporte da Universidade de Osaka (Depto. de Português). Neste processo tive a certeza de que selecionar imagens (e construir uma narrativa com o conjunto selecionado) para uma exposição ou publicação é mais complexo do que produzi-las…Ainda mais quando você tem a responsabilidade de selecionar o material de um mestre da fotografia brasileira como o Itaci Batista.
O objetivo do trabalho foi, além de divulgar a obra fotográfica urbana dos três autores, apresentar a cidade de São Paulo ao público japonês a partir de exposições/workshops em espaços públicos como universidades, escolas, centros culturais, ou seja, Fotografia e Educação caminhando juntas e o resultado disso pode ser percebido pelo feedback bem positivo visto durante as duas exposições e no workshop realizados (2017) e também agora, nos primeiros olhares japoneses sobre o catálogo.
Foram editados 50 catálogos que estão sendo distribuídos entre instituições de ensino (Universidades) e culturais (Bibliotecas) no Brasil e Japão e entre os autores das séries. Portanto o catálogo não se destina a venda.
Na sequência seguem algumas imagens das respectivas séries. Inicialmente, pensei em escrever um pequeno texto com observações sobre as séries, mas por ma questão de espaço nesta coluna e também esperando ouvir do público as impressões variadas sobre as mesmas, preferi deixar o “caminho livre” para interpretação de cada um.
Série “Teatro Urbano” Rogério Akiti Dezem
http://akitidezemphotowalker.zenfolio.com/
Série “Vida entre Linhas” Yuri Bittar
http://www.yuribittar.com/new/index.php
Série “Anônimos” Itaci Batista
https://www.flickr.com/photos/40848634@N02/
Deixo aqui meu sincero “arigatou!” aos amigos Yuri Bittar e Itaci Batista pela inestimável colaboração neste projeto fotográfico. Todas as fotos nesta coluna possuem direitos autorais e não podem ser reproduzidas sem a autorização dos respectivos autores.