A vida do repórter fotográfico: glamour, sacrifício e trabalho pesado
A vida do repórter fotográfico tem sim um certo glamour, o cinema inclusive ajudou a passar essa imagem, mas tem também muito sacrifício e trabalho pesado. O dia-a-dia numa redação é quase sempre muito agitado, e é comum o fotografo sair para cumprir mais de uma pauta, eu várias vezes deixava uma e corria para encontrar com outro repórter fotográfico que estava em outra cobertura, éramos quatro fotógrafos e doze repórteres na redação, então nós fotógrafos tínhamos sempre muito trabalho.
Equipamento pesado do repórter fotográfico
O repórter fotográfico não tem assistentes como quem fotografa em estúdio, logo ele tem que ter o controle e domínio de todo seu equipamento, ter sempre à mão vários cartões de memória, mais de uma bateria e um bom kit de lentes e flash que lhe garantam boas fotos em qualquer situação, e não é raro sair com mais de um corpo de câmera, é sempre melhor prevenir-se que tentar remediar e evitar surpresas, assim o repórter fotográfico também carrega um peso considerável, minha sacola de equipamentos pesava perto de dez quilos, com três lentes básicas, um corpo de câmera, um flash, duas baterias, os cartões e pilhas, muitas pilhas, nós cobríamos muitos eventos em locais fechados e às vezes à noite, e ficar sem pilhas para alimentar o flash é um dos “acidentes” a ser evitado.
O kit básico para fotojornalismo
Nossas pautas cobriam praticamente todas as secretarias de governo então não éramos “setoristas” como em algumas redações, em que tanto fotógrafos quanto repórteres por vezes “cobrem” assuntos específicos como fotografia de esporte, política, artes, etc. Era comum as vezes num mesmo dia eu viajar para uma pauta de segurança, em um presídio por exemplo e à noite ter um lançamento de livro para cobrir em uma biblioteca, com convidados, uma palestra com o autor ou editor, fila de autógrafos, auditório com plateia, enfim ambientes totalmente diferentes.
Então o meu Kit básico para trabalhar consistia em um corpo Canon EOS 1D Mark III e três lentes que “cobriam” qualquer situação que surgisse, uma 16x35mm f1:2.8 muito boa para fotografar um auditório lotado onde invariavelmente os fotógrafos trabalham em um espaço restrito, não se permite deslocamentos. Uma 24x70mm também f1:2.8 que usei muito em eventos, um lançamento com recepção para convidados por exemplo, aí eu podia (devia) circular literalmente “caçando” alguma celebridade, ou algum convidado ilustre, a 24x70mm ajudava pois eu tanto podia fotografar um grupo, usando a área grande angular da sua distância focal, quanto fazer um retrato isolado de alguma autoridade usando o lado meia tele dos 70mm. E por fim minha lente preferida, embora a mais pesada, uma 70x200mm f1:2.8 que funcionava muito bem para retratos ou assuntos à distância quando eu não podia de forma alguma me aproximar muito do meu “alvo”.
Minha pauta “real”
O dia-a-dia na redação em que trabalhei era normalmente corrido e as pautas nem sempre lembravam em nada o tal glamour que muitos idealizam, acreditem, não existe nada de glamouroso numa inauguração de estação de metrô, ou o lançamento de um programa de apoio à população carente de um bairro periférico, ou ainda em um programa de recuperação pelo trabalho para presos em um presídio no interior do estado. Tem mais a ver com correria, empurra-empurra, apertos para buscar um melhor ângulo, e cansaço no fim do dia, mas em algumas ocasiões era diferente, quase glamour.
Em junho de 2014 o príncipe Harry, à época o quarto na linha de sucessão ao trono inglês, esteve visitando o Brasil e no dia 25 visitou uma comunidade em Cubatão no litoral sul de São Paulo. O consulado inglês distribuiu poucas credenciais para a cobertura da visita do príncipe, eu tive o privilégio de ser um dos fotógrafos credenciados para fazer a matéria para o Diário Oficial. Saímos bem cedo aquela manhã eu e minha amiga Maria Zanelli, responsável pelo texto, rumo a baixada santista, além do equipamento do jornal, levei também minha velha amiga guerreira Canon EOS 7D, companheira de vários momentos e um TC 2x (tele converter) que dobra a distância focal da 70x200mm, perde-se um pouco de nitidez e luminosidade, mas em fotojornalismo as vezes transformar uma 70x200mm em uma 140x400mm representa uma vantagem.
Pautas como essa tem um outro diferencial, pode-se planejar com alguma antecedência todo o trabalho, como o credenciamento costuma demorar alguns dias, o repórter fotográfico e toda a equipe responsável pela cobertura têm tempo para esse planejamento. Horário de saída, percurso, local de apoio e pernoite se for o caso, equipamento extra se for necessário, reconhecimento do local onde se realizará a atividade a ser coberta, deslocamentos possíveis ou restrições. No caso da visita do príncipe, o maior problema foi justamente a área restrita reservada aos fotógrafos, que por motivos de segurança, teriam pouca mobilidade.
O príncipe e sua comitiva foram britanicamente pontuais, chegaram à hora marcada e foram para um mirante que existe na comunidade, de onde se avista uma parte da Mata Atlântica e três cidades da baixada santista, Santos, São Vicente e Cubatão. Depois caminhou pela área, conheceu o projeto de turismo ecológico e o sistema de monitoramento e previsão de riscos da região, além dos projetos sociais da Cota 200, um trabalho de capacitação de pessoas em diversas atividades e de assistência a crianças carentes, provou de um prato feito com biomassa de bananas na cozinha comunitária local e seguiu para a última etapa da visita.
Acompanhado por alunos e professores de escolas da comunidade, Harry mostrando-se sempre muito simpático, conversou com moradores, posou para fotos e por fim plantou junto com as crianças uma muda de manacá-da-serra, planta típica da Mata Atlântica e presente em toda a Serra do Mar. Eu e mais alguns fotógrafos conversando com policiais brasileiros encarregados da segurança das crianças, descobrimos onde seria feito o plantio da árvore, e uma maneira de chegar mais perto do príncipe e das crianças nesse momento. Minha 7D, montada com a 24×70 serviu pouco para o trabalho, renderam melhores fotos o conjunto Mark III com a 70×200.
Ao final da pauta voltamos para São Paulo, na redação enquanto a repórter prepara o texto começa para o fotojornalista a parte da edição das imagens. Trabalho difícil escolher entre tantas boas fotos as que entrarão na matéria, feita a escolha e com o aval do chefe da redação, passei para o pessoal do tratamento de imagens quatro fotos, das quatro que depois de tratadas seguiram para a diagramação, uma foi publicada, a que mostra o príncipe uma professora e algumas crianças, parece pouco, problemas de espaço alegou o diagramador, bem fiz o meu trabalho, até que tinha mesmo algum glamour, afinal não é todo dia que você tem a chance de fotografar um príncipe.