O que é um bom equipamento? E isso importa?
Outro dia estava lendo o blog do amigo Luiz Fellipe Carneiro, em seu excelente artigo A história se repete (recomendo a leitura) e imediatamente após finalizar a leitura comecei a escrever este texto.
O artigo escrito pelo Fellipe veio após um fabricante de câmeras fotográficas lançar uma publicidade de um modelo de câmera vendendo a idéia de que com aquela câmera, em 3 minutos você será capaz de fazer fotos com qualidade profissional. Por conta dessa publicidade o mesmo fabricante recebeu uma enxurrada de críticas de algumas centenas de fotógrafos pela internet.
A primeira pergunta que tenho é: há algo de errado na tal publicidade? Vejamos.
Um dos recursos prometidos é que a câmera consiga desfocar o fundo das imagens, característica que é “marqueteada” como imagem profissional na fotografia, e como imagem cinematográfica na área de vídeo. São dois erros, mas não é o caso de alongar isso além de dizer que a estética de uma foto profissional ou de um longa metragem de cinema vai muito além do desfoque de fundo, mas vamos seguir.
Dentro da técnica tradicional, sabemos que o tal desfoque é feito com uma abertura ampla de diafragma, algo como f2, f2.8 associado a um sensor de captura de imagem grande, diferente do que encontramos em celulares e câmeras compactas. Nessa câmera da propaganda você não precisa saber do diafragma se não quiser, você apenas seleciona uma opção no menu que tem um nome como “desfocar o fundo” ou em inglês, que para o marketing parece ficar mais bonito, “background defocus”. E aí vem minha segunda pergunta. É errado o fotógrafo saber que quer é um fundo desfocado, mas não saber que isso é feito pela abertura do diafragma? Ou seja, é errado ele saber a estética desejada e o equipamento tornar isso mais intuitivo?
Seguimos adiante. Outro recurso propagandeado é a qualidade das imagens em lugares escuros, com pouca iluminação. Quem é fotógrafo há mais tempo e estuda sabe que isso acontece pelo fato da câmera ter um sensor de captura de imagens com um tamanho muito maior do que a maioria das câmeras compactas. Com esse tamanho maior há um melhor aproveitamento da luz e assim um rendimento em ISO alto melhor. Aí pergunto novamente, é errado o fotógrafo querer imagens com pouco ruído em boa qualidade em lugares com pouca luz sem saber a razão técnica disso?
Outros recursos incluem uma forma de HDR automatizado e um sistema que faz panorâmicas automaticamente. Eu não usei a câmera e imagino que como todo modo automatizado, haverá situações em que não vai funcionar, mas há algo de ruim em um automatismo que evita que o fotógrafo fique horas no computador?
Onde quero chegar com essas perguntas é na conclusão de que o importante é o fotógrafo saber a estética que deseja e escolher as ferramentas que possibilitam essa estética, e não há mal nenhum se um equipamento facilitar isso. Vou além, ninguém é menos fotógrafo se conseguir obter uma estética riquíssima graças a ajuda do equipamento.
O bom equipamento é aquele que permite ao fotógrafo obter a imagem que deseja, e em meu modo de ver, tanto melhor se isso levar menos tempo e der menos trabalho. É importante ter recursos, quanto mais melhor, o que nos diferenciará não é a quantidade de ferramentas que temos, mas o que fazemos com elas.
Assim sendo, que venham cada vez mais e melhores câmeras, lentes e flashes, que a qualidade se torne cada vez mais acessível e que chegue o dia em que ninguém precisará saber o que é um cinza médio 18%, qual a diferença entre a abertura f4 e a f2.8 ou qual a diferença entre um flash com número guia 40 e outro com guia 50. O dia em que isso tudo acontecer e estiver acessível, a única diferença entre nós será o talento, o bom gosto, o conhecimento de arte e não o quanto temos de dinheiro para investir em equipamento ou o quanto entendemos de questões físico-químico-matemáticas em geral.
E ao contrário do que alguns podem pensar, não, isso não vai matar ou fazer sumir os conhecimentos técnicos que usamos hoje, quem os tiver ainda os utilizará. Ainda hoje existem pessoas que sabem fazer uma placa de colódio úmido e isso não faz com que todos que não sabem (incluindo este que vos escreve) sejam menos fotógrafos, sempre haverá quem prefira fazer contas para medir uma luz.
A propósito, a imagem que ilustra este artigo, que considero uma boa fotografia, foi feita por mim em Paris com uma modesta câmera compacta Canon SX100IS. No momento desta imagem, eu tinha em mãos uma excelente EOS 7D, mas a única lente que estava ali comigo era uma zoom super grande angular que não permitia a perspectiva que eu via na cena, pedi emprestada a câmera de minha esposa e fiz a foto, e neste caso, valeu muito mais a compacta do que a reflex profissional, pois a imagem que eu queria foi possível com ela e não com câmera que em tese seria melhor.
Por fim, não estou dizendo com isso que fotógrafo não deve estudar técnica, ela ainda faz muita diferença no dia a dia profissional da fotografia, nem que deve acreditar no marketing do fabricante de câmeras e achar que o equipamento fará tudo, pois há algo que câmera nenhuma faz por conta própria: ter bom gosto, sensibilidade e talento.
Nos vemos em breve, grande abraço a todos.