Entrevista com Melvin Quaresma
Melvin Quaresma, que atualmente mora em Curitiba, tem apenas 19 anos e uma sensibilidade ímpar para registrar cenas do cotidiano. Conversamos com ele sobre suas inspirações e todo o processo para se conseguir imagens tão significativas:
Quem é Melvin Quaresma?
– Tenho de 19 anos, nasci em Belém, fui criado em Florianópolis. Hoje moro em Curitiba, onde curso Jornalismo na PUCPR. Estou sempre com a câmera no pescoço, no bolso ou na mochila e sou apaixonado por estar na rua fotografando.
Como e quando se iniciou na fotografia?
– Meu primeiro contato com a câmera foi cedo, quando era bem criança e gostava de fazer as fotos da família. No meu aniversário de 7 anos ganhei uma câmera analógica dos meus pais e então comecei a me interessar ainda mais. Acredito que, por ser um tanto quieto e observador desde a infância, o fascínio pela fotografia foi natural. Comecei a estudar a técnica lá por 2008, quando quis aprender sobre processo fotográfico e surgiu a intenção de trabalhar no ramo.
Seu trabalho foge um pouco da mesmice que costumamos ver em urbanas, tem muita expressão e contam histórias, qual é o segredo para se conseguir imagens tão fortes?
– Bom, fico feliz que veja o trabalho dessa forma! Gosto muito de várias fotografias urbanas que vejo nas redes sociais e também me incomoda bastante com algumas “mesmices”. Fotografo as interações humanas que me chamam a atenção… Esses tempos eu tava no ônibus voltando pra casa e vi que um filho repousou suavemente sobre o colo da mãe, click.
Hoje vi dois senhores interrompendo a conversa pra olhar uma moça consideravelmente mais nova passando, click. Às vezes click com câmera, às vezes sem… Pra mim, é um trabalho de observação e atenção ao que acontece ao meu redor. Acredito que, se existe um segredo, é assistir à vida com amor – buscar registrar e contar sobre a tragédia, o drama, a comédia e toda a complexidade dos gêneros e subgêneros que residem no nosso dia-a-dia.
Em fotos de rua, você conversa com os retratados antes ou depois?
– Varia muito. Tem dias em que me sinto menos envergonhado e converso com todo mundo, peço fotos, dirijo os retratados. Tem dias que não consigo interagir direito, faço apenas retratos “roubados”. Não sei bem como funciona a logística por dentro da minha cabeça quando o assunto é a timidez hahahah. Mas acredito que estar com a cabeça tranquila e ser simpático com quem estou fotografando é muito importante. Por mais que o pedido pela foto seja só com um sorriso leve ou um “posso tirar uma foto sua?”, o respeito com quem se fotografa é essencial.
Podemos ver muita expressão nos teus retratos, isso é dirigido ou apenas observado e registrado?
– As duas situações acontecem, mas geralmente é espontâneo. A maioria dos rostos e expressões são o resultado da interação do retratado comigo/com a câmera: a criança envergonhada, o senhor que mostra a língua brincando, a moça que busca o melhor ângulo do rosto, e por aí vai…
O que mais te inspira?
Tem aquela frase famosa em que Ansel Adams diz que na nossa fotografia estão os livros que lemos, filmes que assistimos pessoas que amamos. E é nisso que acredito mesmo… Amo ler e reler Mario Quintana e de alguma forma isso mora na minha fotografia. Sou apaixonado pela obra do Quino (criador da Mafalda), do Robert Doisneau e também vejo um tanto deles no meu trabalho. Tudo que nos toca de alguma forma está ali, entre nossa intenção e o clicar.
Quem são teus fotógrafos favoritos?
Robert Doisneau, Vivian Maier e Steve McCurry são minhas maiores referências. Atualmente, acompanho e admiro bastante o trabalho de Sérgio Ranalli, Fernando Siqueira e do grande amigo Leandro Taques, com quem tive a oportunidade de fotografar alguns projetos em parceria. Gostaria de agradecer ao incentivo de cada um dos três, que sempre foram verdadeiros guias na minha caminhada na fotografia.
Considera importante estudar fotografia ou a prática do dia a dia resolve?
Acho importante estudar a fotografia, entender a técnica e o funcionamento da câmera. Acredito que a melhor maneira de aprender sobre a composição, linguagem é vendo fotografia e conversando com amigos fotógrafos. Nunca fui muito chegado na teoria mesmo, em ler teoria fotográfica, acho que é um grande defeito meu. Quase tudo que aprendi foi na base da observação e de conversas com amigos. E mais importante que tudo isso é fotografar sempre, sempre, sempre.
Como é seu processo de criação?
Geralmente leio bastante foto de manhã, em revistas e sites. É nesse momento que começo a carregar minha vontade de sair da sala da faculdade e voar pra fora hahahaha. Eu tô sempre com a câmera por perto e uso no máximo duas lentes, que cabem no bolso, então o processo é bem simples. Saio, ando, fotografo, chego em casa e gosto de ir tratando algumas coisas. Outras fotos eu deixo em pastas que vou ver e tratar só muito tempo depois. Acho legal fazer isso e é uma boa maneira de ter foto pra tratar quando não fotografo muito e não tenho material novo.
Se você tivesse um patrocínio de alguma empresa para algum projeto fotográfico, qual seria?
Atualmente, o projeto que estou organizando e seria ótimo receber patrocínio é o “Círio”. Eu e mais três amigos fotografamos a procissão do Círio de Nazaré, em Belém e estamos organizando o material pra montar um livro ou uma exposição, quem sabe…
E por fim, qual seria a dica pra quem quer se iniciar em fotografia de rua?
Saia pra rua com uma câmera na mão e assista com calma as coisas que acontecem à sua volta. Acredito que é essencial não ter expectativas de voltar com foto, se preocupar menos com o resultado e mais com a experiência. Muitas vezes volto sem nada, ou com uma foto só. Antes ficava triste, hoje acho normal. Entendi que fotografar vai além de voltar com o arquivo pra casa. Doisneau dizia que, com o tempo, parou de caçar imagens e passou a pescá-las.
Acredito muito nisso. Concentração, calma, aí clica. Veja o cotidiano com amor, tenha interesse real por cada mundo que as pessoas carregam consigo pelas ruas e não tenha medo de receber um “não”. Quando quiser pedir um retrato, tem uma frase que um dia alguém me disse e sempre lembro: “o ‘não’ é o que você tem antes de perguntar. Então pergunta!” hahahaha