Leandro Neves: ele subiu no ônibus certo
A maior parte dos fotógrafos conhece o perfil do twitter do nosso entrevistado. Trocam ideias sobre fotografia, votam nas enquetes, leem as frases filosóficas que ele escreve e principalmente acompanham o blog. Dos mais experientes aos iniciantes. Estamos falando de Leandro Neves, ou melhor, o @dofotografo.
Com 28 anos, nascido no interior paulista – em São Bernardo do Campo – adotou as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro como casa para disparar seus clicks. Estudou três anos de Negócios Internacionais, mas acabou por largar o curso e hoje só trabalha com fotografia, o “ônibus correto”. A carreira, como vocês lerão, começou com uma batalha pessoal e hoje o leva a fazer “retiros espirituais” para que possa praticar e absorver tudo que aprende.
Leandro acredita que no Brasil a troca de informações sobre fotografia é ainda baixa, se comparada com os norte-americanos e europeus. E para ele, a maior dificuldade do mercado nacional são os impostos. Mas para tudo há um segredo: “Na fotografia, se você trabalha duro, estuda e consegue lidar bem com pessoas é impossível não ter sucesso”.
Confira agora o bate-papo que o DG teve com esse fotógrafo.
FOTOGRAFIA DG – Como, quando e por quê você começou na fotografia?
LEANDRO NEVES / @dofotografo: Foi na faculdade meu primeiro contato com a fotografia. Eu era bolsista do PROUNI na Universidade Presbiteriana Mackenzie e optei por seguir um curso que me “garantisse” um futuro. Claro que essa ideia não ia dar certo. Comecei a me sentir frustrado e fui parando de frequentar as aulas. Ao invés de assistir aulas de estatística e contabilidade eu ia para as aulas de photoshop no curso de publicidade e propaganda e assistia história da arte no prédio de arquitetura. Na biblioteca de artes, onde eu passava o maior tempo, conheci o livro O Novo Manual de Fotografia do John Hedgecoe e como eu já gostava de ir a exposições e de fotografia de moda, comecei a estudar profundamente a fotografia por esse livro. Entretanto, eu não podia pegar câmeras emprestadas na faculdade, pois era de administração e não de artes. Em janeiro de 2009, como eu já fazia estágio em uma empresa muito boa, consegui com minha bolsa auxílio comprar uma câmera compacta e fazer as primeiras fotografias. Nessa época eu já estava entrando em uma depressão muito profunda, pois odiava o meu curso, o meu trabalho e todos os valores sociais e éticos daquele meio em que eu estava inserido. Eu trabalhava em uma grande empresa e me cobrava muito para terminar a faculdade, pois eu era bolsista e não queria perder aquela oportunidade, mas fiquei tão doente que fui parar em um pronto-socorro psiquiátrico onde fui medicado e dei início a um tratamento médico. Eu já estava extremamente envolvido com a fotografia e sabia que era isso que eu queria fazer, mas não tinha coragem de seguir em frente. Meu irmão, que é psicólogo, me fez a seguinte pergunta: Leandro, o que você faz quando você pega um ônibus errado? Respondi: Desço no primeiro ponto e pego o correto!
Nunca mais voltei para a faculdade depois desse dia.
DG – Qual foi a experiência fotográfica que te marcou? Por quê? O que você aprendeu com ela?
@dofotografo: A experiência fotográfica que mais me marcou não foi um trabalho comercial e foi uma das minhas primeiras fotos com DSLR. O trabalho é esse aqui:
Quando comecei a fotografar eu tinha um projeto pessoal chamado “Os Excluídos” que consistia em fotografar mendigos, prostitutas, deficientes, idosos, travestis em momentos que mostrassem o lado nobre deles, os seus sonhos, suas vidas além da caricatura e das mazelas que já conhecemos. Para poder fotografar eu precisava criar uma intimidade e passar um bom tempo com eles. Essa foto do beijo foi feita depois que eu limpei o sangue do Toninho. Ele tinha sido espancado e roubado por outros moradores de rua nesse dia. Seus dentes foram quebrados e o resto do que ele tinha foi roubado. O homem que o beija também chorou ao dizer que lhe amava e que era seu melhor amigo. Passei o dia cuidando deles e eles cuidando de mim.
DG – Por que decidiu ser um fotógrafo de moda? O que mais te chama atenção nessa área?
@dofotografo: Antes de entrar na faculdade eu trabalhei com moda durante cinco anos. Fui designer de acessórios para desfiles e publicidade e por isso já tinha contato com o pessoal da moda. Sempre gostei dessa estética e sempre tive uma relação de amor e ódio com esse mundo. O que mais me chama atenção em fotografia de moda é a possibilidade de criar conceitos e fotos, muitas vezes, não comerciais.
DG – Qual /Quais a/as maior /maiores dificuldade (s) de um fotógrafo de moda? Por quê?
@dofotografo: Entre os maiores problemas que afligem um fotógrafo de moda posso citar a dificuldade de aquisição e assistência técnica de equipamentos de alta qualidade para a criação de imagens de moda. Diferente da publicidade, o mundo da moda não dispõe de orçamentos e cachês volumosos que permitam a compra e a manutenção de equipamentos de primeira linha. Muitos fotógrafos de moda compram seus equipamentos com o dinheiro que vem de seus trabalhos na área de publicidade. Além disso, o mercado de moda, especialmente revistas e coleções que desfilam nas semanas de moda, é muito pequeno. São muitos fotógrafos disputando essa fatia do mercado. Além de qualidade no trabalho é preciso conhecer e ser amigo das “pessoas certas”.
DG – Fez algum curso de fotografia ou aprendeu no dia-a-dia, com workshops e tutoriais na internet?
@dofotografo: Todo meu aprendizado foi de forma autodidata. Sempre comprei muitos livros, DVDs e cursos na internet para aumentar meu aprendizado. Continuo comprando cursos pela internet e a cada dois meses eu faço o que chamo de “retiro espiritual” para aprender mais sobre fotografia. Normalmente tiro uma semana de folga para poder estudar e fazer exercícios. Os principais sites que indico são o www.lynda.com , www.kelbytraining.com/ e o fstoppers.com
DG – O que considera essencial em uma fotografia?
@dofotografo: Para mim o essencial em uma fotografia é o que ela causa na pessoa. A foto só termina no espectador. Ela só te importância quando quem vê sente algo e, junto com suas experiências, traz algo para ela.
DG – Como a digitalização da fotografia mudou a fotografia? Quais os pontos positivos e negativos sobre essa mudança?
@dofotografo: Eu já comecei na fotografia digital e agora que estou conhecendo o filme. A fotografia digital permite um aprendizado muito mais rápido e seus custos mais baixos permitiram a popularização da fotografia. Eu não teria condições de ingressar na fotografia se fosse de outra forma. Faz alguns meses que comecei a fotografar com filme e, tirando a aura e a história por trás disso, não vejo nenhuma vantagem sobre o digital.
DG – Como surgiu a ideia do seu blog? Qual o retorno que você tem dele?
@dofotografo: O Brasil não deve compartilhar, por meio das redes sociais, nem 10% do que os americanos e europeus compartilham. Existem muita informação rolando fora do país e as pessoas tem ajudado umas às outras. Quando decidi me tornar fotógrafo eu resolvi compartilhar tudo o que estava aprendendo e quais estratégias estavam sendo bem sucedidas ou não. Com o aumento do trabalho, não tenho conseguido mais escrever no blog como eu gostaria e por isso tenho me dedicado mais ao twitter por ser uma ferramenta muito mais rápida. O retorno é muito grande. Empresas, revistas e fotógrafos quando fazem buscas na internet sobre fotografia acabam, de alguma forma, passando pelo meu blog. Muitos trabalhos aparecem assim para mim. Além disso, é no blog e no twitter que divulgo meu Workshop de Iluminação e Tratamento de Imagem.
DG – Como é sua relação com a edição da fotografia? Prefere fotos mais cleans ou carrega na edição?
@dofotografo: Eu amo edição de fotografia. Amo tanto como amo fotografar. Quero ser reconhecido como grande fotógrafo e grande retoucher. Sou um grande defensor das ferramentas de edição. Tenho uma foto que para fazê-la precisei juntar outras 11 imagens. Entretanto possuo fotos que não possuem edição alguma como – por exemplo – fotos feitas em filme que somente foram digitalizadas.
DG – Qual a maior dificuldade do fotógrafo brasileiro hoje?
@dofotografo: Impostos.
DG – Quem são suas referências?
@dofotografo: Gosto muito de dois tipos de fotógrafos, dos retratistas e dos fotógrafos de moda que possuem um apelo mais sexual: Inez Van Lamsweerde and Vinood Matadin, Mario Schmolka, Bruno Dayan, Guy Bourdin e Helmut Newton.
DG – Deixe uma mensagem para os leitores do Fotografia DG.
@dofotografo: Minha mensagem é direcionada para todos aqueles fotógrafos em início de carreira. A fotografia cresce cada vez mais e, apesar da quantidade de fotógrafos, há muita demanda de serviços fotográficos. Quando comecei a fotografar eu acreditava que demoraria muito para comprar minha primeira DSLR, mas ela veio mais rápido do que eu esperava. Aliás, tudo veio mais rápido do que eu imaginava. A fotografia, além de apaixonante, é extremamente rentável. Os seis primeiros meses são os mais difíceis, mas depois disso cada trabalho vai levar a outro trabalho e não há nada a temer. Na fotografia, se você trabalha duro, estuda e consegue lidar bem com pessoas é impossível não ter sucesso.