Compulsão em fotografar pode ser prejudicial
Pode parecer inofensiva, mas a compulsão pelo ato de fazer suas fotos do evento que você está “vivendo” não é bem sinal de paixão fotográfica.
Um estudo muito interessante foi publicado pela Doutora em Psicologia Linda Henkel do Departamento de Psicologia da Fairfield University. Um resumo do seu trabalho está publicado na APS-Association For Psychological Science e tem um título sugestivo: “Por favor não fotografe. Fotografar prejudica sua memória durante uma visita ao Museu”. Um resumo da matéria em português pode ser encontrado na página Saúde Plena.
Esta publicação esta muito relacionada a campanha Seja um Fotógrafo Amador Consciente, em que é questionado o que seria mais importante, registrar o momento ou vivê-lo. Então vamos entender melhor a relação entre a campanha, que abordava a compulsão de fotografar mas sem o enfoque patológico da questão, e os resultados do estudo, que expõe um aspecto comportamental relevante.
A inspiração para o estudo se deu pela intenção da pesquisadora em saber se a compulsão em fotografar estaria afetando a percepção geral das pessoas em relação ao meio que as circunda e os resultados foram contrários ao senso comum da maioria.
Para testar sua hipótese ela levou um grupo de estudantes ao museu, metade deles fotografando o passeio e a outra metade somente observando. Após a aplicação de diversos questionários, os resultados foram consistentes em mostrar que os que fotografaram absorveram menos detalhes do passeio.
A pesquisadora repetiu o estudo, mas fez com que os alunos com câmeras também fotografassem os detalhes de alguns objetos expostos por meio do zoom ou macro. Neste caso sua capacidade de absorver informações foi maior do que os que não fotografaram. Isto sugere que se a cena possuir menos informações o fotógrafo terá mais capacidade de gravá-las por estar focado nesse campo muito restrito. Provavelmente isto se deve porque este tipo de registro nos faz ficar mais atentos a pequena área fotografada, a questão do foco é mais crítica e percorremos mais vezes a cena com o olhar.
O estudo é importante para esclarecer que a mente humana em geral não está preparada para as duas tarefas simultaneamente. Cuidar dos aspectos relacionados à fotografia como o foco, enquadramento, decidir por um fundo desfocado, superexpor o fundo e etc e ainda absorver as demais informações inerentes ao meio a ser fotografado é demais para o tico e o teco. Isso posto fica claro que devemos mais uma vez fazer uma escolha. Registrar o momento ou vivê-lo.
Agora percebo mais claramente que essa encruzilhada já tinha sido manifestada pela indagação citada na matéria acima, quando é questionado se o mais importante é viver o momento ou registrá-lo.
Outro aspecto que achei particularmente interessante, também abordado pelo estudo, mostra que se você não rever as fotos que foram tiradas, muito pouco fica registrado na sua memória. Fiquei um tanto preocupado com os resultados, porque já venho sentindo um certo incômodo após constatar que muitas vezes eu estava mais preocupado em tirar mais e mais fotos e não dedicava nem um tempinho para interagir com os Gigabytes de imagens acumuladas em meu computador. Será que virei um acumulador digital? Isso é grave? Alguém também já teve essa sensação? Quanto tempo você dedica para rever suas fotos? Minha Nossa, socorro.
Este estudo aborda mais a questão cognitiva, mas fiquei impressionado com a quantidade de retornos obtidos quando encontrei no Google a expressão em inglês “Photography Compulsion Syndrome”. A questão já é amplamente discutida em vários países e muitas vezes tratada como doença.
Existem muitos relatos mundo afora de fotógrafos profissionais sendo xingados e recebendo cotoveladas em plena cerimônia por fotógrafos amadores. Outros que participam de um evento religioso, de negócios ou espetáculo de um artista que simplesmente não conseguem enxergar quem está no palco devido ao mar de braços levantados. Um comportamento tão ostensivo não passaria despercebido dos pesquisadores.
Como todos os comportamentos que fogem ao controle da vontade pessoal, o ato compulsivo de fotografar também é considerado um comportamento sujeito a tratamento médico. Quando o indivíduo perde o controle da sua vontade e se sente impelido a fotografar, mesmo sabendo que isso pode lhe trazer algum risco ou constrangimento sério com parentes e amigos, provavelmente precisa de ajuda.
Como palpiteiro juramentado não poderia deixar de me manisfestar. Caso você tenha sido convidado para algum evento, seja ele casamento, formatura e etc e se quem te convidou contratou profissionais para registra-lo, vamos deixá-los trabalhar. Os momentos mais solenes não podem ser repetidos, como o beijo dos noivos, a entrega do canudo ao formando e por aí vai. Se você foi a um espetáculo musical, foi prestigiar o seu líder religioso e etc procure se lembrar que os que estão atrás de você vieram fazer o mesmo.
Controle o seu impulso de paparazzi. Assim você garantirá que o álbum de fotos dos anfitriões não será invadido por cabeças e braços. Posteriormente você terá acesso a um lindo álbum de fotos de alta qualidade, tiradas com o equipamento de ponta usado pelos profissionais contratados. Os grandes eventos que você participa também recebem cobertura de profissionais e centenas de imagens estarão disponíveis na internet.
Não se preocupe que com certeza você terá muito tempo para tirar fotos com as estrelas da festa nos bailes e jantares pós cerimônia, e essas imagens poderão ser compartilhadas ao infinito e além. Nestes momentos os anfitriões vão estar com toda a paciência do mundo e curtindo muito cada clique.
Se não conseguir se controlar, provavelmente está precisando de ajuda.
Ah, não se esqueça de “tirar a poeira” dos velhos álbuns de fotos esquecidos em seu computador.
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